Cyprinodontiformes vivíparos e ovovivíparos

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Mitologia P.G.A.

Miguel Andrade - publicado neste sítio em Outubro de 2008 ( artigo original concluído em Agosto de 2008 )


Há poucas semanas atrás, uma amiga telefonou-me sugerindo-me que escrevesse um artigo no meu sítio na Internet.

Mostrava-se francamente saturada de ouvir, ( ou ler nos fóruns ), os restantes aquariofilistas a considerarem os vulgarmente denominados “ vivíparos “ como os “ parentes pobres da aquariofilia “ ou de os ver desvalorizados e renegados apenas para principiantes, logo a seguir aos peixes vermelhos ( Carassius auratus ).

Sendo bióloga de formação académica, perguntei-lhe prontamente porque não assumia essa missão.

Respondeu-me que os vivíparos não eram na realidade da sua especialidade, pois só muito recentemente estava manter uma primeira espécie, à experiência, num dos seus aquários, ( contrariando a tendência tradicional ).

Porém aquilo que mais me convenceu foi ter acrescentado que esta era uma incumbência para um aficionado amador, pois só um aquariofilista saberia, melhor do que ninguém, como comunicar com os seus semelhantes, utilizando a linguagem e a forma mais convenientes.

Foi este último argumento que me levou a assumir o encargo de desmistificar os principais preconceitos instituídos; aceitando a sua proposta.

Começo pois por vos esclarecer que P.G.A. são as iniciais de Poeciliinae, Goodeinae e Anablepinae, três sub-famílias de peixes, onde estão classificadas espécies que dão à luz crias vivas e completamente desenvolvidas.

Não são os únicos, ( mesmo em água doce ), mas têm algo em comum... são todos Cyprinodontiformes, ou seja, fazem parte de uma grande ordem com características muito peculiares, ( as quais muito gosto me dava desenvolve-las aqui, mas que de momento não se enquadram nos objectivos deste artigo de opinião ).

Apenas em algumas palavras, ( para não fugir muito aos objectivos deste artigo ), gostaria no entanto de resumidamente apenas realçar que os Cyprinodontiformes constituem um grupo muito variado rondando as 900 espécies de peixes, os quais são encontrados principalmente em água doce ou salobra de regiões tropicais e temperadas.

Enquanto a vasta maioria dos peixes se reproduz depositando ovos, nesta grande ordem encontramos no entanto três grupos de peixes que dão à luz crias vivias e plenamente desenvolvidas.

Em vários artigos científicos é possível lerem-se estudos sobre os resultados relativos ao histórico de vida e às suas singulares qualidades, como a fertilização interna, a modificação da barbatana anal dos machos para formarem um órgão de copula, a viviparidade e o aparecimento de placentas, entre outras particularidades. Os dados comprovativos de como estas singularidades surgiram, podem ser obtidos através da filogenia molecular, a qual nos ajuda a compreender como é que estas características evoluíram de forma independente em espécies destas três sub-famílias.

Um certo número de outras extravagâncias podem facilmente ser observadas ou comprovadas por outros tipos de metodologia científica.

A evolução dos espermatozeugmatas ( que produzem uma espécie de espermatóforos ou aglomerados de espermatozóides em cápsulas especiais usadas na inseminação das fêmeas ), por exemplo, não funcionou como o método fundamental e indispensável para a fertilização interna. De facto, algumas das espécies utilizam esperma livre na fecundação interna das fêmeas.

Os procriadores que dão à luz crias desenvolvidas, desde os que usam formas arcaicas de viviparidade até aos mais refinados tipos de ovoviviparidade, evoluíram apenas na sub-família Poeciliinae.

As formas mais avançadas de viviparidade, evoluíram de antepassados ovíparos e ovulíparos por várias vezes em espécies de Poeciliinedeos, Goodeinedeos e de Anablepinedeos.

Algumas destas espécies fazem parte dos mais conhecidos peixes de aquário, vivendo, em certos casos, como animais domésticos há mais de um século.

Dada a sua tendência para as mutações e a particularidade de mostrarem certa propensão para o aparecimento de indivíduos invulgares, ( ou mesmo populações tão distintas que por vezes se apresentam já na fronteira da classificação como subespécie ), desde muito cedo foi possível obterem-se variedades excêntricas em cativeiro, nomeadamente através de selecção artificial dos reprodutores ou de cruzamentos entre duas espécies ( híbridos ).

Particularmente os peixes que apresentam uma maior dispersão geográfica, ainda hoje nos maravilham com a diversidade de regionalismos, ou com a inclinação natural para a pluralidade de características morfológicas e de cores distintas entre os indivíduos, ( designadamente os machos devido à competição sexual ).

Geralmente as formas domésticas distinguem-se dos parentes selvagens pelo colorido exuberante e fora do comum, por barbatanas excepcionalmente desenvolvidas ou por ambas as características. Tais particularidades fazem as delícias dos aquariofilistas, ( à luz dos conceitos estéticos humanos ), mas esses exemplares teriam uma curtíssima longevidade no meio natural, sobretudo devido aos predadores.

Existem actualmente autênticos especialistas neste tipo de manipulação e são igualmente muitos os clubes e associações de aficionados desta modalidade a criarem, em determinadas espécies, estirpes domésticas extravagantes.

Em certos países acontecem eventos e exposições onde os mais conceituados especialistas desta prática arrecadam prémios em concursos através das suas novidades. Há mesmo regras internacionalmente reconhecidas entre os criadores, nomeadamente quanto aos padrões físicos e anatómicos a respeitar, os quais são divididos em categorias.

Enquanto as variedades selvagens vão sendo preteridas, à medida que novas e mais aliciantes linhagens domésticas surgem, desenvolveu-se entretanto uma indústria milionária, em boa parte à custa dalguns destes peixes seleccionados em particular.

Actualmente o seu valor económico no mercado mundial de ornamentais é impressionante e influencia até uma parte do orçamento de alguns Estados ou sectores da economia como o do transporte aéreo.

Para quem ainda não descobriu dos peixes que estamos a falar deixem-me arriscar alguns nomes comuns...

Se meramente a título de exemplo, vos informar que estão classificadas na sub-família Poeciliinae as espécies Guppy - Poecilia reticulata, Platy - Xiphophorus maculatus, Cauda-de-Espada ( ou simplesmente Espada para os amigos mais íntimos ) - Xiphophorus helerii, e as Molinésias ( ou Mollies ) - Poecilia velifera, Poecilia sphenops, entre outros; estou certo que todos vós, sem excepção, já estarão a ver de que peixes estamos a abordar neste breve artigo de opinião.


Vivíparos ?

Como sobre este assunto já havia escrito um texto preliminar, vou aproveitar a maior parte do mesmo para desmistificar esta terminologia popular.

O mecanismo mais comum de reprodução entre os peixes é o ovulíparo, isto é, a fêmea liberta os óvulos na água ( desova ) e o macho liberta os espermatozóides em simultâneo, aí tendo lugar a fecundação e a posterior meiose, ou seja desenvolvimento embrionário.

A maior parte dos Cyprinodontiformes usa esta forma de reprodução.

Algumas das espécies da família Goodeidae e um considerável número na família Poeciliidae são casos de ovuliparidade.

Nos peixes ovíparos dá-se uma variação neste processo pois a fecundação é interna, ou seja, os espermatozóides são introduzidos no corpo da fêmea, onde irão entrar em contacto com os óvulos. Após a fecundação os zigotos ( ovos ) são expelidos para o meio externo ( a água), a fim de prosseguirem o seu desenvolvimento entregues à sua sorte.

Este processo é semelhante ao das aves mas ocorre num número muito restrito em raras espécies de peixes. Uma delas é um pequeno Poecilídeo denominado Tomeurus gracilis.

O que é comum a estas duas estratégias é o facto do embrião se desenvolver dentro de um ovo libertado na água, sem ligação à respectiva mãe.

Uma outra forma de proteger os zigotos, diametralmente oposta, é deixá-los desenvolverem-se dentro do corpo da progenitora.

Calcula-se que evolutivamente esta estratégia tenha sido desenvolvida em duas fases.

Numa primeira fase, deve ter surgido a ovoviviparidade.

Após um processo de fertilização interno, o ovo não é imediatamente libertado mas recebe a protecção física da mãe em relação ao meio ambiente durante o seu processo de desenvolvimento até à eclosão.

Tal como os zigotos dos ovulíparos e dos ovíparos, o ovo dos ovovivíparos tem as suas próprias reservas nutritivas e o embrião desenvolve-se independentemente do metabolismo materno, ( o qual apenas lhe confere protecção ).

Pensa-se que numa segunda fase, alguns peixes evoluíram para a viviparidade.

O corpo materno deixaria então de servir apenas como protecção, sendo a relação com os embriões gerada no próprio metabolismo da mãe.

Através desta estratégia, o contacto entre a progenitora e os embriões engloba a troca de metabólicos, incluindo a nutrição do embrião, ( e abrangendo a passagem de anticorpos contra eventuais doenças), o fornecimento de oxigénio, etc.

Uma consequência destas últimas duas estratégias é que o número de zigotos não pode ser muito elevado e a fêmea não pode repetir o processo de gestação com tanta frequência.

Em contrapartida, os embriões têm maior probabilidade de sobreviverem, enquanto estão sob protecção da mãe, nascendo igualmente já suficientemente independentes para subsistirem por si próprios.

Entenda-se aqui o termo gestação como o intervalo compreendido entre a fecundação do óvulo e a expulsão ou libertação das crias ( fetos plenamente desenvolvidos ).

Este período é ainda marcado por adaptações progressivas do organismo materno, nomeadamente caracterizado por um aumento de volume do útero, por alterações circulatórias, endócrinas e do trato gastro-intestinal, entre outras.

Todos os P.G.A. que dão à luz crias e que não efectuam posturas são ovovivíparos ou vivíparos.

Quase todos os Poecilíneos e Anableptídeos são espécies ovovivíparas, enquanto os Goodeiídeos que não põem ovos são vivíparos ( mais ou menos verdadeiros conforme a espécie ou o género ).

Dessa forma, a denominação popular dos Poecilíneos de aquário deveria ser ovovivíparos e não vivíparos.

Apenas quando nos referirmos a Goodeiídeos é seguro falar de viviparidade.

Fáceis de manter ?

Depende...

As mais vulgares espécies ovovivíparas conservadas em aquários desde finais do século XIX não podem continuar a ser o paradigma de referência.

Além de uma natural resistência a condições adversas, a longa permanência em cativeiro tornou-os, ao fim de umas quantas gerações, mais adaptados à existência em aquário.

Ainda assim, as condições de transporte combinadas com as de higiene nos entrepostos ou durante todo o circuito que culmina no retalho comercial ( às vezes até agravadas em muitas lojas de animais ), provocam ainda hoje taxas de mortalidade importantes.

Os indivíduos que sobrevivem, quando instalados num aquário minimamente bem cuidado e caso perdurem aos efeitos de doenças, ( que se declaram após o período de incubação ocorrido durante a viagem até nossas casas ), acabam por se revelar de facto como peixes ornamentais muito robustos e pouco exigentes.

Dessa constatação óbvia e devido à adaptabilidade entretanto desenvolvida durante a longa manipulação por parte dos seres humanos, os principiantes são muitas vezes aconselhados a manterem-nos, para dessa forma irem ganhando a necessária experiência, preparação e saber.

Não podemos cair no erro de interpretar esta experiência comum como um padrão.

Não podemos classificar da mesma forma todas as espécies ou, até mesmo animais selvagens  destas espécies recentemente capturados na natureza.

De facto existem algumas das restantes espécies que nunca se tornarão populares porque são tudo menos fáceis de manter e de cuidar com sucesso em cativeiro.

Se por um lado os parentes selvagens das estirpes domésticas se revelam mais exigentes em termos de cuidados, certas raridades, pouco ou nunca vistas em aquário, revelam-se logo como acessíveis apenas aos especialistas, pois descobre-se que se podem vir a revelar-se como algumas das mais sensíveis e difíceis de manter.

Apesar da capacidade inata de adaptação a novos ambientes e de uma reconhecida resistência, por parte da maioria, algumas dessas espécies evoluíram em ambientes muito específicos e mostram pouca ou nenhuma capacidade para sobreviverem nas nossas águas canalizadas.

Outras reagem mal quando nos afastamos dos seus parâmetros químicos habituais, sobretudo numa dada direcção.

Apesar disso, ambientes extremos em termos de temperatura, salinidade e outras particularidades, são o ecossistema onde evoluíram alguns destes casos mais delicados.

É praticamente tão difícil recriar em aquário a química das águas próprias para certos peixes vivíparos e ovovivíparos como a do aquário marinho de recife de coral.

Outro factor vital, desconhecido ou ignorado pela maioria dos aquariofilistas em relação ao insucesso com certos membros destas famílias é a temperatura.

Se em relação às espécies mais comuns, habitualmente é muito fácil regular as águas dos nossos aquários para os limites compreendidos dentro da gama ideal.

Porém, manter outros seus parentes todo ano entre 24ºC e 25ºC ou submetê-los a uma amplitude térmica de 3ºC a 5ºC durante toda a sua vida, acabaria por abreviar a sua longevidade e revelar-se-ia mesmo fatal cedo demais.

A dispersão de algumas das espécies é de tal ordem, que estão presentes numa grande variedade de climas.

Os antepassados dos Poecilíneos mais correntes são sobretudo originários de climas tropicais da América Central ou do Norte da América do Sul.

Alguns dos nobres desconhecidos da aquariofilia são porém provenientes de regiões com climas totalmente diferentes, ( e por vezes antagónicos em vários aspectos ).

Há casos em que as temperaturas que se fazem sentir dentro do ambiente doméstico das nossas habitações lhes são letais, ( senão em parte do ano pelo menos a longo prazo ).

Na época de maior calor esse meio é desadequado porque a água está demasiado quente para determinados peixes sobreviverem.

Na época mais fria do ano acontece o mesmo, porque não está suficientemente fresca para certos processos fisiológicos sazonais de Inverno ocorrerem. No mínimo certas espécies deixam de se reproduzir ou perdem parte considerável da sua imunidade se forem privadas do frio necessário à sua saúde.

Espécies há, que tendo evoluído em águas puras de nascentes, não toleram sequer os valores médios do ciclo de nitrificação dos aquários, ou certas descidas de pH resultantes dos processos químicos que aí ocorrem. Dessa forma, se não são promovidas trocas parciais de água muito frequentes nos seus aquários ( nalguns casos diárias ), acabam por não resistir e morrem de forma súbita sem razão aparente nem sintomatologia perceptível.

E o que dizer da alimentação, dos regimes de iluminação, ou até de certas condições específicas para as exigências ecológicas fundamentais de algumas das tais raridades em cativeiro ?

Embora muitas espécies sejam de facto o paradigma da resistência e adaptabilidade, desenganem-se aqueles que pensam que não encontram fabulosos desafios de elevada exigência na manutenção de Cyprinodontiformes vivíparos e ovovivíparos.

Reprodução fácil ?

Por incrível que possa parecer, a resposta é... nem sempre !

Pelo facto de originarem crias desenvolvidas e independentes, a reprodução destas espécies é vulgarmente aceite como acessível mesmo aos principiantes.

A reprodução em si, na maioria das mais comuns variedades domésticas, não oferece de facto muita dificuldade. Em relativamente pouco tempo, mesmo os aquários menos adequados ficam superlotados de crias.

Se por um lado a sobrevivência de um elevado número de descendentes produz uma autêntica explosão demográfica, a falta de espaço disponível faz com que os efeitos nefastos da endogamia em breve tomem conta do grupo mantido pelo aquariofilista comum.

Apesar disso, aparentemente, o maior desafio parece ser salvar os recém-nascidos dos restantes peixes que vivem no mesmo aquário, ou mesmo de mães e parentes que praticam o canibalismo.

Esse instinto foi desenvolvido ao longo do processo evolutivo de umas quantas espécies, e funciona, provavelmente, como mais uma forma da natureza permitir a sobrevivência em ambientes restritos ou noutras circunstâncias existentes no meio natural.

Infelizmente, devido às particularidades da vida em cativeiro, ( sobretudo por falta de espaço vital ou devido a uma alimentação desadequada ), algumas espécies, que na natureza apenas apresentam este comportamento em situações muito raras e particulares, passam a ser canibais " a tempo inteiro ".

A solução mais vulgar para salvar os recém-nascidos veio a revelar-se como um importante meio catalizador daquilo que se pretendia evitar.

A partir de certa altura, o mercado encheu-se de pequenas caixas de plástico divididas com grelhas onde as fêmeas em gestação são forçadas a sofrerem uma reclusão atentatória de elementares direitos dos animais. Essa prática traz frequentemente consequências lancinantes para a saúde, tanto das gestantes como das suas crias.

O resultado por vezes manifesta-se em abortos espontâneos, nado-mortos, elevada mortalidade infantil e stress... muito stress.

A insuportável angústia da mãe pode-se transmitir à geração seguinte em evidentes problemas de saúde ou comportamentos anómalos... como o canibalismo.

Ainda que só os maiores aquários disponham de condições para a reprodução sustentada e natural de todas as espécies, os pequenos aquários maternidade são sem dúvida a forma mais “ humanizada “ de enfrentar a questão da reprodução em cativeiro.

Tal como as espécies que optaram por outras estratégias de reprodução ( os ovíparos e ovulíparos ), as variedades selvagens de alguns vivíparos e ovovivíparos, estão longe de apresentarem os padrões das comuns estirpes domésticas em relação à facilidade de procriação.

Nos peixes recentemente chegados ao cativeiro, nem a fertilidade nem a fecundidade se assemelham ao que acontecia nas suas populações originárias que vivem na natureza.

Algumas espécies nem se revelam mais fáceis nem mais difíceis de se reproduzir do que as ovulíparas, exigindo mesmo uma preparação especial em certos factores ambientais particulares.

Há circunstâncias em que obtemos crias com pouco esforço, mas também os há em que a frustração é igual à de quem espera que um dia se descubra o que pode levar uma determinada espécie que liberta os ovos na água a desovar.

Voltando ainda ao anterior exemplo de práticas deploráveis das gaiolas maternidade, algumas futuras mães podem prolongar por muitos meses uma gestação que previsivelmente deveria decorrer apenas em menos de 30 dias, pelo simples facto de estarem em angústia.

Nalguns outros exemplos é necessário um período com “ repouso de Inverno “, a temperaturas menos elevadas, caso contrário as consequências para a fecundidade ou para a saúde das crias são evidentes.

Nos casos mais graves os peixes podem mesmo cessar a reprodução por motivos fisiológicos ou hormonais.

Mesmo as espécies de reprodução contínua, ( como as mais vulgares mantidas em aquário ), sofrem por vezes interrupções sazonais excepcionais na natureza, quer motivadas por factores relacionados com o clima, ou com o ciclo alimentar, mas também até com outras ocorrências menos conhecidas.

Também é justo admitir que criar condições para certos ovovivíparos e vivíparos acasalarem ou para as respectivas fêmeas entrarem em gestação, pode ser mais fácil do que condicionar a desova de certos ovulíparos.

Contudo, embora não tão exigentes como certos depositadores de ovos, há de facto casos difíceis e complicados entre os que dão há luz crias já desenvolvidas, sobretudo entre alguns ilustres desconhecidos do grande público.

Outro argumento que é comum ser evocado para justificar a maior facilidade de reprodução dos vivíparos e ovovivíparos em relação aos ovulíparos e ovíparos é sem dúvida o tamanho das crias recém-nascidas.

Em comparação com as minúsculas larvas dos peixes que põe ovos, os peixes que dão à luz produzem menos descendentes de cada vez mas estes são muito maiores e mais independentes.

Isto acentua-se ainda mais nos vivíparos. Os recém-nascidos de espécies relativamente pequenas ( com 10 cm de comprimento máximo ), são já enormes à nascença, podendo surgir logo com 19 mm a 24 mm.

Se é uma verdade inegável que crias enormes sejam muito mais fáceis de criar ou de alimentar, do que outras minúsculas e indefesas que necessitam ainda de algum tempo para se desenvolverem após a eclosão de um ovo; as necessidades específicas de alguns desses vivíparos recém-nascidos compensam em dificuldade aquilo que o tamanho e desenvolvimento à nascença facilitam. As preocupações do criador com questões ambientais e de alimentação, exigidas pelas crias de certas espécies, são de tal ordem, que as mesmas não subsistem mais do que algumas semanas num aquário inapropriado.

Coloridos e interessantes ?

Coloridos sim, particularmente as variedades domésticas mas mais raramente os animais selvagens.

Habitualmente, a sobrevivência e a selecção sexual competem ao longo de milénios de evolução, pelo que o resultado final dos peixes actuais foram sendo condicionados pelos predadores e pelo meio ambiente durante milhões de gerações.

De um lado temos as fêmeas, as quais, ( tal como os seres humanos ), preferem barbatanas mais desenvolvidas e machos extremamente coloridos. Do outro temos os animais que se alimentam dos peixes que também preferem os machos mais vistosos ( que sobressaem bem no ambiente onde procuram abrigo ) e barbatanas longas que lhes atrapalhem a fuga.

Com a diversidade natural destas espécies, algumas populações isoladas anteciparam-se ao paciente trabalho dos criadores humanos e originaram esplendorosos machos coloridos, contudo, por motivos óbvios, a maior parte das espécies não é de facto muito atraente para a contemplação da aquariofilia mais tradicional.

De qualquer forma é bom relembrar que a moda é passageira.

Enquanto num determinado momento o vermelho vivo é a cor da moda, logo a seguir os tons de um camuflado militar fazem furor e estão por toda a parte.

Por razões de sobrevivência é mais natural e óbvio que um peixe vista “ camuflado “, do que exiba por todo o corpo um laranja florescente.

O que poderia mudar um pouco era o desprezo que demonstramos pela natureza, em particular ao desconsiderarmos uma autêntica “ obra de arte “, fruto de milhares de anos de ajustamento.

Há porém um lado desconhecido em muitos animais que à primeira vista “ não têm cor “.

Tais “ obras de arte “, podem não ter o magnetismo do peixes marinhos tropicais dos recifes de coral, mas neles podemos vir a descobrir, se olharmos com mais atenção, algum encanto e sedução.

Os ocelos, as marcas, os pontos, as riscas, as manchas, os tons e reflexos inesperados fazem muitas vezes o que uma monotonia das cores mais belas nunca conseguiria.

Peixes adultos saudáveis e felizes com o seu ambiente, quando vistos sob o efeito luminoso e fundo correcto transformam muitos “ patinhos feios “ em impressionantes e esplendorosos cisnes.

Se expostos da forma mais favorável, algumas espécies que afastariam de imediato o comum dos cidadãos da frente de um aquário de venda, despertam em muitos de nós um inexplicável hipnotismo.

Infelizmente para muitos, as singularidades que podem competir com colorido vistoso dos seus parentes ovulíparos, ( conhecidos vulgarmente como “ killies “ ), não estão acessíveis ao principiante.

O interesse dos Cyprinodontiformes para além da fisionomia, não advém de comportamentos sociais complexos mas da sua biologia e ecologia.

Através deles as crianças podem evoluir da fábula da cegonha para uma versão interessante da própria concepção e nascimento. Testemunhar o nascimento dos peixinhos será uma lição de vida explicada pela própria natureza no aquário doméstico.

Manter estes peixes pode não se tornar um aliciante espectáculo, mas esconde seduções imprevisíveis.

O orgulho de manter com sucesso uma população viável pertencente a uma espécie extinta na natureza é sem dúvida uma delas.

Em conclusão :

Do que anteriormente foi escrito, pode-se concluir que há um fosso considerável entre o paradigma aplicável pela aquariofilia menos informada aos ditos “ vivíparos “ e a realidade dos Cyrpinodontiformes vivíparos e ovovivíparos, ( da qual faziam inclusivamente parte os seus antepassados ).

E o que dizer a quem queira evoluir para formas selvagens e está no início da sua experiência na aquariofilia ?

Há tantas espécies por explorar, que mesmo as escassas novidades que vão aparecendo em cativeiro, de longe a longe, oferecem possibilidades óptimas também para o principiante.

A diferença é que podem não ser tão extravagantes em termos de colorido como as variedades domésticas e algumas delas necessitarem de maior grau de responsabilidade com vista à sua manutenção sustentável.

O número de hipóteses eticamente mais adequadas para habitarem os aquários vulgares entre os Cyprinodontiformes vivíparos e ovovivíparos é muito superior ao de outras famílias importantes no mercado dos peixes ornamentais.

Algumas minúsculas preciosidades permitem mesmo manter uma pequena população geneticamente viável por muitos anos e sem problemas de endogamia através de uma comunidade com várias gerações de indivíduos que convivem em harmonia.

Possuir uma linhagem com origem demarcada é uma das formas mais avançadas e modernas de estar neste passatempo dos aquários.

Manter com sucesso uma espécie em perigo devido às actividades humanas no seu habitat natural, constitui um valiosíssimo acto de civismo, mas acima de tudo um precioso gesto de remissão em relação aos erros que contribuíram para a situação actual desses seres vivos nas suas origens.

Sem querer deixar transparecer qualquer manifesta condenação às práticas de selecção artificial de reprodutores; termino apenas dizendo que, aprender a apreciar os animais selvagens, independentemente da sua aparência, é um relevante progresso deontológico que nos encherá de orgulho quando, de forma espontânea, nos dispusermos a recriar com plena verdade o mundo natural num cantinho da nossa casa.
 


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